16.7.08

pessoa, fernando pessoa

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não sei quantas almas tenho.
cada momento mudei.
continuamente me estranho.
nunca me vi nem acabei.
de tanto ser, só tenho alma.
quem tem alma não tem calma.
quem vê é só o que vê,
quem sente não é quem é,
atento ao que sou e vejo,
torno-me eles e não eu.
cada meu sonho ou desejo
é do que nasce e não meu.
sou minha própria paisagem;
assisto à minha passagem,
diverso, móbil e só,
não sei sentir-me onde estou.
por isso, alheio, vou lendo
como páginas, meu ser.
o que segue não prevendo,
o que passou a esquecer.
noto à margem do que li
o que julguei que senti.
releio e digo:
"fui eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.
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fernando pessoa
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Um comentário:

  1. é, queria saber o que se passava na cabeça dele quando ele escreveu isso!

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