28.12.10

a crônica do primeiro encontro

E ele apareceu. Do lado de cá, o coração apitava quinze pras sete. Os olhos arregalaram, a boca se abriu lentamente, a mão gelou. Era ele, alto, negro, calmo, incrível, adorável como sempre. Desejado como no sonho. Ela passou os braços por cima da bolsa grande, que foi comprada da última vez, e naquele momento mais nada existiu. Nem pessoas, passos, música, nem data, clima ou as poesias. Só ele existia, afinal só ele insistia. Derrubou seus braços e seu corpo de encontro ao dele, e suspirou aliviada – e trêmula disse – até que enfim. No colo do seu abraço, as coisas e as cores voltaram ao sentido, as pessoas, os passos, a música, a data, o clima e principalmente as poesias, mas de volta ao real, ainda assim, naquele momento só ele existia, e ela cedia. Ele a abraçou uma vez, e duas, e ela sentiu seu cheiro uma vez, fechou os olhos, sentiu duas e desejou, que ali começasse um ciclo que ela já esperava.

Ele a convidou para almoçar, mas as pernas não acompanhavam o ritmo do resto do corpo, porque o corpo acompanhava o ritmo dos batimentos cardíacos que fora coordenado por um dos sambas ouvidos no caminho.

Um espaço, uma mesa, duas cadeiras, um almoço. Ele a flertava com os olhos, e pela primeira vez, ela não conseguia por em prática seu arriscado plano de encanta-lo e fugir depois. Seus olhos fitavam o próprio prato quase vazio, ela se concentrava para enxerga-lo da forma que seria mais fácil de aceitar – uma fraude, mais um engano. Seu coração deu um salto, ele a olhou profundamente, e naquele momento já não existia pra onde fugir ou como faze-lo. Era ali que ela queria estar, na frente dos olhos dele, estender seu braço, e tocar com a mão a sua mão, dizendo: estou aqui, eu te sinto, eu te toco, você me toca, e eu não sei como.

Mentira, porque ela sabia, no fundo sempre soube que essa fuga seria impossível. Existiam provas sem contradições, era nato, forte e o pior de tudo, leve.

Uma hora, duas, a conversa fluía solta, ela nem sentia, e mal podia esperar de novo seu corpo em contato com o dele, sua boca finalmente beijando a dele. Eles saíram, sentaram-se, e mais conversa - pareciam mesmo viciados em palavras, gestos, discursos. Ela já não suportava mais, nem ele, então de forma natural, carinhosa, e adorável, o primeiro beijo, o primeiro que parecia ser um de tantos outros mil beijos dados, durante toda uma vida. Foi estranho, ao mesmo tempo, que novo, foi incrivelmente natural.

Ela já conhecia aquele beijo, era o mesmo dos desejos e idealização acometidas durantes os últimos dois anos e tantos meses.

O susto tomou conta, o medo enraizava nas suas veias. Não era mentira e ele, não era uma fraude. Adeus a ideia de idealização. Ele estava ali, a poesia personificada, uma ideia de carne, osso, caras e cor. Ele acabara de receber o posto, do único tipo de homem no mundo, que receberia seu total respeito. Ele existia, e insistia em existir. E ela já não tinha como não ceder.

Três horas. Quatro. Aquele dia acabaria, ele ficaria por ali, ela entraria no carro e voltaria pra casa. Começou a doer, apertar, uma dor desconhecida, forte, com um tônus diferente. Não sabia que nome dar, nem qual dos analgésicos pegar na bolsa. Não tinha sentido aquilo antes, talvez fosse problema das 6 xícaras de café que tomou durante o dia pra manter o equilíbrio, mas não era, era mais, era a presença dele ficando, e deixando lugar pra saudade que já fazia parte daquele encontro. Não tinha remédio, teria de suportar aquele tipo de dor. Aquele vazio que ficou espaço ao seu lado, que já parecia ter nome, sobrenome e CPF.

O relógio dizia 17h. Hora de levantar, interromper beijos, abraços e calor. Caminharam até a porta. Os corpos um na frente do outro, os olhos um na frente do outro, o sonho, o medo, a vontade, a angústia, o vazio, a esperança, um na frente do outro, respectivamente nessa ordem.

Um olhar cheio de sentimento. Um toque leve no braço, o perfume, o gosto, o cheiro, os sonhos. Os lábios. – Não me despeço, digo até logo. Não se despeça, não temos que nos despedir mais, ela disse em voz baixa, dessa vez sem vigor na voz que sempre era posta.

Ela voltou pra casa, arrumou as malas e vai mudar de vida, dessa vez tem mais coisa na bagagem, e mais companhia na viagem. Com tantas crônicas pra contar tantos finais, ela espera conseguir escrever um livro, de tantos primeiros encontros com uma pessoa só.


Claudilene Neves



3 comentários:

  1. Foi a coisa MAIS linda que vc já escreveu até hj! E sabe o que me anima muito? É só a primeira de um livro... de MUITOS livros!! Ai, aiii (suspirando)

    Dé,

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  2. Olá, boa tarde.
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  3. eu preciso da biografia do autor juliano martinz

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